De meu bisavô, Francisco Cândido de Oliveira - Relato acerca de seu suicídio: o que me contaram

          Das gerações anteriores aos meus pais, conheci os meus avós maternos, Tomaz Teodomiro de Oliveira e Idila Galvão de Lira (Idila Galvão de Oliveira, após o casamento). Dos meus bisavós, apenas conheci João Plácido de Lira (Joca Paz), meu bisavô materno, pai de minha avó Idila. No entanto, tive a oportunidade de por várias vezes ouvir alguns relatos, de um deles, Francisco Cândido de Oliveira, ô meu outro bisavô materno, pai de meu avô Tomaz Teodomiro (Tomaz Cândido). Me foi dada a fotografia que está postada ao lado. Me disseram que "Chico Cândido" é o homem de costas, e que a fotografia é da década de 1920. A fazenda, realmente é o Tamanduá, onde nasceram, meu avô Tomaz, seus irmãos, e muitos dos seus descendentes.
          Pois bem: Chico Cândido é, provavelmente, o segundo filho do casal Cândido de Oliveira Mendes (1842-1915) e Laurinda Bezerra de Vasconcelos (1857-1885), já que antes dele, sabemos de um primeiro filho do casal chamado Manoel, que deve ter falecido ainda quando criança, e por desconhecermos a data do casamento dos meus trisavós Cândido e Laurinda, é que sou forçado a usar o "provavelmente" para citá-lo como segundo filho do casal. Meu bisavô Chico Cândido nasceu a 24/07/1875, nesta mesma Fazenda Tamanduá, em C. Novos. Seu pai, Cândido de Oliveira Mendes, o "Cândido Gordo", paraibano da Serra de Dona Inês, foi o primeiro intendente (prefeito) de Currais Novos (de 20/04/1891 a 22/01/1892), e viria a ocupar o mesmo cargo por mais duas vezes (de 03/10/1892 a 31/12/1895, e de 01/04/1896 a 03/04/1898).
          Chico Cândido recebeu de herança, parte da terra do Tamanduá de Cândido Gordo, seu pai, assim como todos os irmãos. Nesta fazenda de herança, estabeleceu-se para criar sua prole, que de 14 filhos nascidos, somente 8 chegaram à idade adulta, dentre eles, meu avô Tomaz. O algodão Mocó era o carro-chefe da economia do Seridó daquela época, aliado à pecuária. E como não haveria de ser diferente, meu bisavô era "homem de algodão". Sua fazenda, era uma das poucas que tinha  instalado um vapor de algodão, para o beneficiamento da safra. De algumas pessoas, ouvi relatos que àquela época somente existiam 6 vapores de algodão na região, dentre os quais, o do Tamanduá.
          Chico Cândido foi homem de posses, ainda que levasse uma vida campesina, como nao haveria de ser diferente em terras do Seridó do começo do século XX. O algodão mocó gerava riquezas no Seridó, e sustentava famílias, vilas e cidades com seu alto valor econômico. Na região, muitas famílias de seridoenses levantaram fortunas cultivando algodão, e Chico Cândido, dizem ter sido um dos grandes produtores em suas terras.
          Todo esse relato de "ouvi dizer", é para chegar ao final trágico do meu bisavô.
          Naquele tempo, não existiam bancos na região. O dinheiro era guardado em casa.
          No final da década de 20, foi divulgado que a Coluna Prestes, os "comunistas", passariam por Currais Novos, o que apavorou não somente a população local, mas principalmente os fazendeiros da região, já que as notícias eram de que "os comunistas" vinham praticando saques em todos os lugares por onde haviam passado anteriormente, e que muitos produtores haviam sido desfalcados de suas finanças pelos homens da Coluna Prestes. Sabendo da notícia, Chico Cândido preocupou-se com suas economias, dinheiro vivo, talvez mantido em um dos cômodos de sua casa do Tamanduá, em sacos, em colchões, como tantos dizem ter sido prática dessa época. Fato ou folclore popular, o fato é que as economias realmente eram guardadas em casa. Tomado pelo pavor de também ser saqueado, Chico Cândido buscou esconder suas economias, de forma a não perdê-las para os saqueadores que estavam por chegar.
           Lembram do vapor de algodão que relatei anteriormente? Pois bem. Ele ainda está lá no Tamanduá. Não o maquinário, que dizem ter sido vendido há muitos anos atrás, mas o prédio que o abrigava. Uma área desse prédio, era destinada a guardar parte da semente ou do "caroço de algodão" - como se diz no seridó -, do que sobrava do beneficiamento da pluma. Fiquei intrigado ao saber disso, mas me relataram que àquela época, não se tinha a prática de utilizar o "caroço de algodão" para alimentar os animais. Era produto descartado em sua quase totalidade. O que se "amontoava", era para renovar os plantios, ou para extrair um pouco de óleo, para uso doméstico. Chico Cândido elegeu o amontoado das sementes (ou caroço), para depositar todo o dinheiro que tinha em casa. Assim, não haveria como os "saqueadores" achar suas economias, da safra daquele ano. Em sua concepção, seria o local mais improvável de acharem o dinheiro. E dizem que era bastante dinheiro... talvez fosse não somente as economias daquele ano, mas da vida inteira. O fato é que os empregados da fazenda descobriram a "butija" no algodão, e levaram tudo, para em seguida abandonarem a fazenda à própria sorte do patrão, agora pobre. A coluna Prestes não veio, mas o dinheiro foi-se.
          Chico Cândido, com este episódio, entrou em profunda depressão. Ficou "fraco do juízo" como dizem nas simplícias palavras dos sertanejos do meu lugar. A família, antevendo um fim trágico, de pronto recrutou a um dos empregados da fazenda, para, doravante, acompanhar os passos do meu bisavô, diuturnamente. Chico Cândido, em sua depressão pelas perdas, e acredito que pela luta vencida em retomar suas finanças, reerguer-se financeiramente, no dia 15 de Agosto de 1931, por volta das 11:00 horas, levantou-se da mesa em que almoçava - já que havia acabado a refeição antes de todos -, e dirigiu-se rapidamente aos seus aposentos, em meio a protestos de todos os presentes, e enforcou-se nos cordões da rede em que tinha o hábito de deitar-se. Os ralatos daquele dia é que sentavam-se à mesa, além do meu bisavô, a minha bisavó Porfíria Isabel, meu avô Tomaz Teodomiro e seu irmão, meu tio-avô Vicente Cândido, além de algumas outras pessoas, dentre os quais, aquele que o acompanhava constantemente, o qual nunca me disseram o nome, mas que era um dos empregados da fazenda.
          Depois do episódio do suicídio de meu bisavô, iniciaram-se conflitos entre os irmãos, pelas terras deixadas, ainda que minha bisavó, D. Porfíria, fosse viva. Assim, anos mais tarde, meu avô Tomaz tomou a frente das discussões, e vendeu a propriedade, dando a cada um dos irmãos, a parte que os cabia, e levando para viver consigo, sua mãe, e sua irmã caçula, Josefa Celestina. Mais tarde, se juntaria a Josefa, uma outra irmã, Laurinda Olindina, que viveram sob os cuidados de meu avô Tomaz até o fim de suas existências.
           Minha bisavó Porfíria, morreu na Fazenda Cacimba do Meio, em casa de seu filho Antônio Cândido, quando em uma de suas idas alí, o que era constante.
           O Tamanduá do meu bisavô é terra árida, sertão do Seridó, torrão de minhas origens maternas, que guarda umbigos de muitos dos meus em seus mourões de porteiras, como reza a tradição do sertão. Me senti em casa, quando lá estive pela primeira vez em 2009. E hoje, o Tamanduá próspero de outrora, está quase abandonado, restando algumas edificações maltratadas pelo tempo, como o armazém do vapor de algodão, com parte do seu telhado de ripas de craibeiras destruído (o que delata a falta de zelo e abandono dos proprietários atuais, que por sinal são meus parentes próximos), o curral de pedras, arrodeado de cocheiras e um mourão de medeira de lei ao centro,  e a casa onde nasceu a prole de Chico Cândido e Porfíria. 
       Esse é um lugar que gostaria de chamá-lo de meu... 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Árvores Genealógicas dos descendentes de João Plácido de Lira, em seu primeiro casamento com Maria Galvão

Descendentes de Antônio Pires de Albuquerque Galvão e Guilhermina Francisca de Medeiros

Fotografias - Parte II